04/03/2012

POEMA MATUTO: "A QUEIMA DE ESPINHO"


Lembrando o meu Carirí, e o seu céu de azul anil,
saluçando de sodade, cum meu coração a mil,
vô falá de um rituá, qui quem vê se sente má,
no nordeste do Brasil.

Falo da queima de espíin! Quando a sêca a castigá,
o meu querido sertão, nuis obriga a praticá.
Páima, sodóro e fachêro, macambira; cumpanhêro;
p'ro gado se alimentá.

O gado, quage sem fôrça, chega pidindo clemença.
Juntíin da coivara in chama, ispera cum paciença.
Só tem o côro e o ôsso, a légua e meia do poço,
in totá abistinença.

Se bota o espíin no fogo, adispôi do espíin queimado,
o espíin se dirmancha, fica o tronco cunzinhado.
E uis bichíin alí, de êito, come aquilo sastisfeito,
se sintindo alimentado.

Dispô anda légua e meia, pru mode a sêde matá.
Num poço véio, ô cacimba, c'um o vaquêro a vigiá.
Dispôi, ôta caminhada; mais ôta légua de istrada,
mode drumí no currá.

E o vaquêro, adispôi disso, se banha mode ciá.
Na mesa só tem farinha, e macássa n'água e sá.
Quando tem sorte e fartura, um boró de rapadura,
e farofa de jabá.

Dispôi reza, pede a Deus, mode ais coisa amiorá.
Se deita mais a muié; se ela nêle se inroscá;
na hora êle corresponde, cum fôrça num sei dadonde,
prá mais ela chamegá.

É triste, mais é verdade, o qui eu lhe relato aqui.
Cuma é doloroso e triste, o cantá da jurití.
Lhe juro in minha poesia: Na sêca êsse é o dia a dia,
no sertão do Carirí...

Autor: Bob Motta

Poema classificado em sexto lugar no IX FESERP-FESTIVAL SERTANEJO DE POESIA, PRÊMIO
AUGUSTO DOS ANJOS, em dez 2001 na Cidade de Aparecida-PB.

Fonte: http://www.bobmottapoeta.com.br/publicacoes.aspx#

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